domingo, 29 de agosto de 2010

Sugestão de gabarito para a segunda questão da prova da DPGE

XXIII CONCURSO DA DEFENSORIA PÚBLICA DO RIO DE JANEIRO/2010

PROVA ESPECÍFICA DE CIVIL

SUGESTÃO DE GABARITO

Prof. Felippe Borring



2. Questão

a) A princípio a manifestação da PGE no inventário que tramitou na Comarca de Carmo foi correta. Isso porque o art. 1.001 do CPC estabelece que as questões de alta indagação não podem ser resolvidas nos autos do inventário, sendo necessária a sua remessa às vias ordinárias. Por questão de alta indagação, deve-se entender aquela que demanda de instrução probatória para ser resolvida. Logo, somente podem ser resolvidas questões incidentes ao inventário quando forem de direito ou puderem ser julgadas pelos documentos e afirmações constantes dos autos (Câmara, Lições, vol. III, p. 468). Neste sentido:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INVENTÁRIO. NOMEAÇÃO DE INVENTARIANTE. COMPANHEIRA DO DE CUJUS. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE DECLARAÇÃO JUDICIAL DA UNIÃO ESTÁVEL. 1. A COMPANHEIRA DO FALECIDO SOMENTE PODE SER NOMEADA INVENTARIANTE, QUANDO A UNIÃO ESTÁVEL FOR RECONHECIDA JUDICIALMENTE. ALÉM DISSO, NÃO HÁ NOS AUTOS COMPROVAÇÃO DA ANUÊNCIA DOS HERDEIROS QUANTO À NOMEAÇÃO PRETENDIDA. 2. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJDF – 3ª Turma Cível – AI 0006908-58.2010.807.0000, Des. Rel. Nidia Correa Lima, j. em 04/08/10)

Não obstante, caso a companheira do falecido tivesse formulado sua pretensão com documentos suficientes para o julgamento da questão relativa à sua união estável (declarações, fotos, certidões, comprovantes de residência etc), o ponto poderia ser resolvido nos autos do inventário (art. 984 do CPC). Neste sentido:

INVENTÁRIO. Reconhecimento de união estável nos autos do inventário - Possibilidade - Documento apresentado é apto à comprovação do fato - Desnecessidade da remessa da discussão às vias próprias - Recurso improvido. (TJSP – 7ª Câmara de Direito Privado – AG 990102405524, Des. Rel. Alvaro Passos, j. em 30/06/10)



b) A questão não deixou claro se o ingresso de Maria ocorreu na ação de inventário ou na ação de reconhecimento de união estável. Como a questão fala que os filhos de Ana seriam “réus”, parece ser mais correto presumir que o ingresso ocorreu na ação de reconhecimento de união estável. A forma de intervenção de Maria nos autos da ação de reconhecimento de união estável em curso na Comarca de Rio Claro é como litisconsorte necessária passiva (companheira de João). Maria não é terceira, mas integrante necessária do pólo passivo da demanda. Note-se que o fato de Maria ter uma decisão judicial transitada em julgado não significa que a demanda deverá ser julgada improcedente. Isto porque Ana e seus filhos não foram atingidos pela coisa julgada formada em decorrência do processo de declaração de união estável que tramitou na Comarca de Carmo. Assim, pode Ana provar que é a verdadeira companheira de João e, assim, sair vitoriosa da demanda. O ideal, entretanto, é que essa demanda fique suspensa até a resolução das questões pendentes em outras demandas.

c) Ana poderia propor na Comarca de Carmo duas ações anulatórias (art. 486 do CPC), tanto da partilha feita no inventário, por ausência de herdeiro (STF – Pleno: RTJ 81/797 e 82/800), como da ação declaratória de união estável, por falta de litisconsórcio necessário (art. 47 do CPC). Importante lembrar que a ação rescisória prevista no art. 1.030, III, do CPC, só é cabível para quem participou do processo, seus sucessores e o Ministério Público. Ana também poderia opor-se ao ingresso de Maria nos autos da ação de reconhecimento de união estável em tramitação na Comarca de Rio Claro. Poderia, também, incluir o bem que pertenceu ao falecido em Carmo no inventário em curso na Comarca de Rio Claro. Frise-se, por fim, que a jurisprudência não reconhece a possibilidade de uniões estáveis simultâneas. Logo, uma das duas relações terá que prevalecer, excluindo a outra, ressalvada a distinção, ao longo do tempo, entre ambas (p. ex., na hipótese de ser provado que Maria teve união com João de 1980 e 1987 e Ana, daí em diante).

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