sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Suspensão de segurança não pode ser utilizada como recurso


O presidente do STJ, ministro Felix Fischer, rejeitou pedido de suspensão apresentado pelo MP/SC contra decisão do TJ/SC em MS. Segundo a decisão, o pedido de suspensão de segurança não pode ser utilizado como mero recurso diante de decisão proferida pelo tribunal de origem.
O MP ajuizou ação civil pública contra uma empresa de publicidade, alegando a formação de pirâmide financeira com o objetivo de lesar clientes e obter lucro fácil. Em 1ª instância, foi deferida liminar para desconsiderar a personalidade jurídica da empresa e decretar a indisponibilidade dos bens móveis e imóveis, inclusive ativos financeiros registrados em nome dos sócios.
Após decisão do TJ/SC no sentido de manter o bloqueio dos bens e da atividade da empresa, os sócios impetraram mandado de segurança no mesmo tribunal e obtiveram liminar. Em virtude disso, o MP apresentou ao STJ o pedido de suspensão de segurança, sob o argumento de que a última decisão do TJ premia o enriquecimento ilícito, levando ao prejuízo grande parte dos cooptados pela pirâmide em questão; torna viável a fraude e incentiva o surgimento de iniciativas fraudulentas do mesmo tipo.
Sustentou ainda que a decisão do TJ/SC representa ameaça à segurança jurídica, à vedação do enriquecimento ilícito e à economia popular.
Ao analisar o caso, o ministro Fischer afirmou serem quatro os requisitos necessários para o cabimento do pedido de suspensão: decisão proferida em ação proposta contra o poder público; requerimento do MP ou de outra entidade legitimada; manifesto interesse público ou flagrante ilegitimidade da decisão atacada e grave lesão a um dos direitos tutelados pela lei que trata do assunto – ordem, saúde, segurança e economia públicas.
De acordo com o ministro, no caso do MP/SC e da suposta pirâmide financeira o pedido de suspensão não preenche um dos requisitos de admissibilidade que permitiriam o seu conhecimento, "uma vez que não há uma ação ajuizada contra o poder público que justifique o incidente excepcional".
Para Fischer, mesmo que fosse ultrapassada a vedação de natureza processual, os bens citados pelo MP a serem protegidos, embora sejam valores que "devam ser protegidos pelo ordenamento jurídico como um todo, não o são pela legislação de regência do presente pedido de suspensão".
Portanto, conforme afirmou Fischer, a ausência de identidade entre os bens supostamente violados e os tutelados pelo pedido de suspensão não justifica o deferimento da medida, cabível apenas em situações excepcionais e para evitar grave lesão à ordem, saúde, segurança e economia públicas.

Processo relacionado: SS 2696
terça-feira, 28/1/2014

Sentença estrangeira precisa ser homologada pelo STJ

Sentença estrangeira só tem eficácia no Brasil depois de homologada pelo Superior Tribunal de Justiça ou por seu presidente. Esse entendimento foi usado pelo ministro Felix Fischer, presidente do STJ, ao negar pedido de liminar feito pela Siemens. A empresa pedia a competência exclusiva do Tribunal Arbitral da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) na discussão sobre o fim do contrato com a empresa Woodbrook Drive Systems Acionamentos Industriais (WDS). Para o presidente do STJ, não ficou comprovada nos autos a eficácia da decisão estrangeira no Brasil.
O caso envolve a rescisão de contratos de licenciamento, fabricação, venda e distribuição de tecnologia, marcas e produtos firmados entre a Siemens e a WDS. Em razão da ausência de solução amigável sobre o fim dos contratos, a Siemens requereu a instauração de procedimento arbitral perante a CCI para conseguir a declaração de rescisão contratual. 
Paralelamente, a WDS interpôs medida cautelar preparatória na 6ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo, na qual foi deferida liminar para suspender todos os efeitos da rescisão dos contratos e impedir a Siemens de praticar quaisquer atos inconsistentes com a manutenção do contrato de licenciamento, até o julgamento da disputa pelo tribunal arbitral, sob pena de multa diária de R$ 50 mil. 
Decisão arbitral
O tribunal arbitral foi constituído e a sentença decidiu pela rescisão dos contratos, revogando integralmente a liminar anteriormente obtida pela WDS perante a Justiça comum. No julgamento da medida cautelar, no entanto, o juízo da 6ª Vara Cível de SP julgou procedente o pedido da WDS, sob o fundamento de que a decisão arbitral, para ter validade, deveria ser homologada pelo STJ. 
A Siemens, então, moveu ação, com pedido de liminar, defendendo a competência exclusiva do tribunal arbitral para decidir sobre os contratos firmados entre as partes e a incompetência absoluta do juízo da vara cível , além da suspensão dos efeitos da sentença da medida cautelar. 
Sem eficácia
Felix Fischer, porém, lembrou que a sentença arbitral estrangeira não foi homologada perante o Superior Tribunal de Justiça. “A própria suscitante informa que o requerimento de homologação da sentença arbitral, com o fim de que possa receber o exequature ser objeto de execução forçada em território nacional, já foi apresentado por Siemens perante este tribunal e se encontra em curso, sendo que há nos autos tão somente cópia da referida petição protocolada em 21 de novembro de 2013”, acrescentou o presidente do STJ. 

Fischer também questionou a existência de conflito de competência, já que a sentença proferida pelo juiz da 6º Vara Cível do Foro Central de São Paulo declarou a eficácia da decisão até a homologação da decisão arbitral. A apreciação do mérito será feita após as férias forenses, sob a relatoria do ministro João Otávio de Noronha. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

PRINCÍPIO DA SINGULARIDADE. INTERPOSIÇÃO DE UM ÚNICO RECURSO PARA ATACAR DUAS DECISÕES DISTINTAS.

A Turma, considerando as especificidades do caso, entendeu ser possível a interposição de um único recurso de agravo de instrumento para impugnar duas decisões interlocutórias dis-tintas proferidas no mesmo processo. In casu, cuidou-se, na origem, de ação de execução de título extrajudicial, sendo que, após iniciado o cumprimento provisório da sentença, o recor-rente opôs exceção de pré-executividade. O juiz singular proferiu duas decisões interlocutó-rias: a primeira (em 30/7/2007) extinguiu a exceção de pré-executividade por irregularidade da representação processual e autorizou a penhora online de ativos financeiros em nome do executado; já a segunda (em 29/10/2007) autorizou o levantamento do valor penhorado e depositado judicialmente mediante a prestação de caução. Ocorre que o recorrente, em vez de impugná-las separadamente, por meio de dois agravos de instrumento, interpôs um único recurso. Nesse contexto, inicialmente, ressaltou-se que o princípio da singularidade, também denominado da unicidade do recurso, ou unirrecorribilidade consagra que, para cada decisão a ser atacada, há um único recurso próprio e adequado previsto no ordenamento jurídico. Sendo assim, salvo as exceções legais – embargos de declaração e recurso especial e extra-ordinário –, não é possível a utilização de mais de um recurso para impugnar a mesma deci-são, sob pena de o segundo não ser conhecido por preclusão consumativa. Entretanto, desta-cou-se que o aludido princípio não veda a interposição de um único recurso para impugnar mais de uma decisão. Tampouco subsiste, na legislação processual, qualquer impedimento a essa prática, embora seja incomum. Assim, consignou-se que, na hipótese, não se trata de aplicação do art. 244 do CPC, pois há previsão legal quanto ao recurso cabível contra deci-são interlocutória (art. 522 do CPC), sendo também desnecessária a aplicação do princípio da instrumentalidade das formas, visto que o recorrente utilizou-se do recurso correto (respeito à forma) para impugnar as decisões interlocutórias, qual seja, o agravo de instru-mento. Ademais, considerou-se que, na espécie, a interposição do agravo por meio de duas petições separadas e o julgamento separado dos recursos poderia gerar decisões conflitantes. Isso porque a segunda decisão (que autorizou o levantamento do valor penhorado) é depen-dente da primeira (que extinguiu a exceção de pré-executividade oposta pelo executado e autorizou a penhora daquele valor). Por fim, asseverou-se que, embora a interposição de um único recurso para impugnar mais de uma decisão não seja uma prática recomendável, reco-nheceu-se que, de acordo com as particularidades do caso, o não conhecimento do agravo importa violação do art. 522 do CPC, porquanto a parte, além de ter o direito de recorrer das decisões interlocutórias, utilizou-se do recurso previsto na legislação para tanto, ou seja, o agravo de instrumento. Assim, a Turma deu provimento ao recurso, para anular o acórdão recorrido e determinar o retorno dos autos ao tribunal de origem, a fim de que seja apreciado o mérito do agravo de instrumento. REsp 1.112.599-TO, Rel. Min. Nancy Andrighi, jul-gado em 28/8/2012.


quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Câmara deve concluir votação do novo CPC em fevereiro

28 de janeiro de 2014
ANÁLISE DE DESTAQUES
Deve ser concluída pela Câmara dos Deputados em fevereiro, logo após o fim do recesso parlamentar, a votação dos cerca de 40 destaques ao projeto do novo Código de Processo Civil. A previsão foi feita tanto pelo relator da matéria, deputado Paulo Teixeira (PT-SP), como por Fabio Trad (PMDB-MS), deputado que presidiu a comissão especial sobre o tema. O novo CPC tramita na Câmara como o Projeto de Lei 6.025/05, apensado ao PL 8.046/10, e a votação do texto principal foi concluída em novembro de 2013, faltando apenas a análise dos destaques.
Entre os pontos que ainda não foram votados, três são considerados pelos parlamentares os mais polêmicos. O primeiro diz respeito à possibilidade de pagamento de honorários para advogados públicos, medida incluída no projeto e que pode ser retirada a pedido do PP e PMDB, com apoio do governo. O segundo envolve o modelo de prisão para quem não pagar pensão alimentícia, já que a bancada feminina defende a manutenção do regime fechado, enquanto o projeto inclui o regime semiaberto como regra, já que o regime fechado seria adotado apenas em casos de reincidência.
O terceiro destaque polêmico partiu do PTB, que quer inviabilizar a penhora on-line, impedindo que juízes possam bloquear as contas para pagamento de dívidas em caráter liminar. Mesmo com as divergências, Fábio Trad (foto) acredita que o novo CPC será votado antes do Carnaval, “dando ao país um novo Código de Processo Civil, afinal o atual é de 1973". As modificações, porém, farão com que o texto retorne ao Senado após a conclusão de sua análise pelos deputados federais.
Entre as principais mudanças que o novo CPC trará, aparece o incentivo à mediação e conciliação como formas de solucionar conflitos em casos envolvendo Direito de Família, Direito do Consumidor e pedidos de indenização. O projeto também prevê a resolução de demandas repetitivas, para evitar que causas com o mesmo pedido se multipliquem no Judiciário. 
De acordo com Paulo Teixeira, atualmente “um cidadão entra com uma causa no Judiciário, outro com a mesma, e as decisões são diferentes. Estamos exigindo que o Judiciário aplique a jurisprudência e justifique a sua sentença”. Para isso, após o primeiro caso começar a tramitar, demandas semelhantes seriam suspensas até a resolução da situação, e o entendimento seria aplicado aos outros casos. A medida é criticada, por forçar a criação de precendentes, sem a necessária discussão da matéria.
Com informações da Agência Câmara.

domingo, 26 de janeiro de 2014

O descaso judicial como causa de proliferação dos recursos

Por José Rogério Cruz e Tucci

Há, com certeza, um equivocado consenso entre os leigos de que a interposição de recurso constitui estratégia que conspira contra a duração razoável do processo. Realmente, dúvida não há de que um processo longo transforma-se, em última análise, em um cômodo instrumento de ameaça e pressão, uma arma formidável nas mãos dos mais privilegiados em detrimento do direito dos litigantes desafortunados! Todavia, sob a ótica da técnica processual, é evidente que a interposição do recurso previsto na lei não tem o condão, por si só, de tisnar a efetividade do processo. Se, por uma vertente, o advogado, que aspirou ser essencial à administração da justiça, ao lado do juiz, é destinatário do dever de zelar pela celeridade processual, é certo que, por outra, tem ele inarredável compromisso profissional com o seu cliente, nos quadrantes da garantia constitucional da ampla defesa.

A esse respeito, duas observações se impõem: a) havendo uma centelha de chance, na aferição objetiva e prudente feita pelo advogado, o recurso deve ser interposto; e b) a conduta abusiva, com deliberada intenção de retardar a marcha do processo, a par de ser coibida pelo Código de Ética e de trazer notório desprestígio à atuação pessoal do advogado, deve ser reprimida pelo órgão jurisdicional.

Ressalte-se, ademais, que, antes de ser o recurso a causa que propicia a lentidão, na verdade, são as “etapas mortas” — entre outras, o tempo de espera do julgamento do recurso — que determinam a intempestividade da prestação jurisdicional. Partindo-se de dados empíricos, resulta inequívoca a existência de um flagrante descompasso entre a legislação codificada e a realidade do serviço judiciário. Não é concebível — apenas para dar dois exemplos corriqueiros — que, em pleno século XXI, o tribunal ad quem, após quase dois ou três anos de angustiante expectativa dos interessados, não conheça de um recurso de apelação, porque a competência é da outra seção; ou, ainda, depois de todo esse tempo, dê provimento ao recurso para anular a sentença, pela preterição de um litisconsorte necessário. Mas não é só.

A qualidade das decisões tem deixado muito a desejar. À míngua de dados estatísticos, a experiência tem demonstrado que há uma significativa margem de recursos providos: Agravos, Apelações e Recursos Especial e Extraordinário. Nesse particular, conta muito a falta de humildade do juiz, que, na maioria das vezes, mesmo diante de um notório equívoco, deixa de reconsiderar a decisão errada, determinando a interposição de Agravo ou — o que é pior — de Apelação. Em outras oportunidades, o desprezo, pelo magistrado, à letra do texto legal ou aos precedentes consolidados, também culmina com um recurso, que, provido, acarreta o inconveniente de retornar tudo à estaca zero.

Apenas para dar um singelíssimo exemplo, dentre tantos outros análogos, causa enorme perplexidade o número de recursos providos na sessão de julgamento de 12 de dezembro de 2013 da prestigiosa 36ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo: a Apelação n. 0000166-89.2010.8.26.0581 foi provida pelos experientes e conceituados desembargadores Jayme Queiroz Lopes, relator, Pedro Baccarat e Arantes Theodoro, com fundamento na falta de atenção a regra expressa do CPC, uma vez que, segundo constou do voto condutor, “a inércia do autor autoriza a extinção do processo com base no inc. III do art. 267, que trata do abandono da causa por mais de 30 dias. E, nesta hipótese, exige-se, além da intimação dos patronos, também a intimação pessoal da parte para suprir a falta em 48 horas, em observância ao disposto no parágrafo 1º do art. 267, o que aqui não ocorreu, razão pela qual fica reformada a sentença, devendo o feito ter regular prosseguimento...”.

Este imperdoável descuido por magistrado de primeiro grau deu ensejo ao provimento, pela mesma turma julgadora, de mais dois recursos por idêntico fundamento. Ainda a guisa de exemplo, na mesma sessão de julgamento, a referida 36ª Câmara de Direito Privado proveu também mais três Agravos de Instrumento, de relatoria do ilustre desembargador Jayme Queiroz Lopes, com fundamento em error in procedendo: AI 2009587-61.2013.8.26.0000 (Apelação julgada deserta, quando o tema da gratuidade poderia ser novamente invocado), AI 2031780-70.2013.8.26.0000 (equivocado indeferimento de inclusão no polo passivo de sucessor inter vivos) e AI 2034017-77.2013.8.26.0000 (não aplicação de multa, em flagrante ofensa ao art. 461 do CPC).

Aduza-se, outrossim, que, no primeiro semestre de 2011, o CNJ, com o intuito de otimizar a gestão e o planejamento da administração da Justiça, publicou um importante diagnóstico dos 100 maiores protagonistas nos tribunais brasileiros. Colhe-se desse valioso documento que o INSS é o maior demandante, fazendo-se presente em 22,3% das ações do rol daqueles litigantes. Seguem-no a Caixa Econômica Federal (8,5%) e a Fazenda Nacional (7,4%). Verifica-se que 95% do total de demandas dessa listagem provêm do setor público, entidades financeiras e prestadoras de serviço de telefonia. Como acima observado, em muitas situações, a interposição de recursos manejados por estes mesmos litigantes aos tribunais superiores constitui um comportamento malicioso — verdadeira chicana —, para extrair da inexorável demora da prestação jurisdicional todas as vantagens e benefícios daquela decorrentes.

São potencialmente estas causas e não propriamente os recursos que retardam a tramitação do processo!

É necessário, portanto, coibir o abuso processual e jamais preconizar, de forma arbitrária, a mutilação do sistema recursal visando a tornar a justiça mais rápida!

José Rogério Cruz e Tucci é advogado, ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo e professor titular da Faculdade de Direito da USP

Revista Consultor Jurídico, 21 de janeiro de 2014

sexta-feira, 24 de janeiro de 2014

Juiz disponibiliza atendimento online para facilitação do acesso à Justiça

Para facilitar o acesso ao Judiciário e economizar tempo, um juiz da comarca de Patrocínio Paulista (a 413 km da capital do estado de SP) está atendendo advogados pelo Skype — programa de telefonia com vídeo pela internet. O juiz Fernando da Fonseca Gajardoni adotou a tecnologia, também utilizada pela ministra do Superior Tribunal de Justiça Nancy Andrighi, no último dia 15 e diz que foi motivado pelos problemas enfrentados por advogados de outras cidades, como Franca, Ribeirão Preto e São Paulo, que são obrigados a se deslocar quando precisam despachar na comarca em que ele atende.
Segundo o juiz, ninguém reclamou da mudança, muito pelo contrário. “Houve elogios, principalmente pela disponibilidade de se facilitar o acesso e ganho de tempo do advogado”, conta.
Uma das possibilidades que se cria com o novo procedimento é o aumento da transparência, diz Gajardoni (foto), uma vez que é possível gravar o atendimento e juntá-lo ao processo. Outra vantagem do atendimento online apontada por ele é que o serviço pode ser prestado por meio de dispositivos móveis como celular, inclusive quando o juiz estiver fora da unidade, como em casos de correição.
Diferentemente da ministra Nancy Andrighi, que separa as manhãs de terça-feira para receber os advogados, o juiz diz que o atendimento aos advogados não pode ser mensurado, pois é feito todos os dias da semana, “sendo muito variável”.
Preocupado com o gerenciamento de tempo dos operadores do Direito, Gajardoni afirma que o Judiciário está vivendo uma evolução tecnológica. Ele cita o exemplo do juiz Luiz Barrichelo, de Limeira (SP), que faz os atos de citações e intimação de réus presos por videoconferência. “Todo o proceder do Oficial de Justiça fica gravado, inclusive as advertências e explicações ao preso sobre o ato praticado. Do ponto de vista processual, isso é genial!”, comemora.
O juiz não pediu autorizações formais ao Tribunal de Justiça de São Paulo para o novo atendimento, por entender que faz parte da autonomia do juiz, mas acredita que a iniciativa terá o apoio da corte. Ele lembra que o presidente da corte, desembargador Renato Nalini, e seu antecessor, Ivan Sartori, “sempre incentivam juízes a inovar na gestão”.
Marcos de Vasconcellos é chefe de redação da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 22 de janeiro de 2014.
Execução Título Judicial Provisória Honorários Fixação Trânsito Julgado
“RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. HONORÁRIOS. 
1. Para efeitos do art. 543-C do CPC, firmam-se as seguintes teses: 
1.1. Em execução provisória, descabe o arbitramento de honorários advocatícios em benefício do exequente. 
1.2. Posteriormente, convertendo-se a execução provisória em definitiva, após franquear ao devedor, com precedência, a possibilidade de cumprir, voluntária e tempestivamente, a condenação imposta, deverá o magistrado proceder ao arbitramento dos honorários advocatícios. 
2. Recurso especial provido” 

(STJ – Corte Especial – RESP 129173/PR – Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. em 20/11/2013)

sábado, 18 de janeiro de 2014

Legitimidade Herdeiro Defesa Herança Universalidade
Direito a herança pode ser defendido por só um dos herdeiros
Por ser uma universalidade, a herança pode ser defendida por apenas um dos herdeiros, sem que haja posicionamento dos demais. A decisão é da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça. No caso, já enfrentado anteriormente pelo STJ e reanalisado pela turma após embargos de divergência, a doação efetuada pelo pai foi questionada por uma das herdeiras.
Três meses antes de morrer, o proprietário doou 100% de um apartamento, seu único bem, a sua companheira. Após o falecimento, a filha entrou com uma ação anulatória de doação. Em seu pedido, solicitou a nulidade da doação no tocante a 50% do imóvel, uma vez que existiam herdeiros necessários. 
O juiz de 1° grau reduziu a doação para 25% do valor do imóvel. O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro considerou que a doação seria válida e eficaz com referência a 75% do valor do bem doado, perdendo sua validade nos 25% que seriam de direito da filha do doador. Segundo o TJ-RJ, a autora não seria parte legítima para defender os interesses do irmão, também herdeiro necessário. 
Meação
Ao analisar o caso pela primeira vez, o então relator, ministro Jorge Scartezzini, levou em consideração o direito à meação decorrente de união estável, o que restringiria o alcance de doação a 50% de imóvel. A outra parte do bem já seria da companheira. Porém, o fundamento da meação não foi apreciado nas instâncias originárias, o que justificaria a reanálise da questão. 
Para o ministro Raul Araújo, atual relator do processo, a controvérsia a ser analisada nos autos diz respeito a duas questões: a pretensão da filha na redução da doação à metade do bem, excluído o percentual indisponível que cabe aos herdeiros necessários, e a redução a 25%, uma vez que só um dos filhos reclamou a sua parte. 
O relator afirmou que, de acordo com o Código Civil de 1916, em vigor na época dos fatos, e de ampla jurisprudência, o doador poderia dispor de apenas 50% de seu patrimônio e não de sua totalidade, uma vez que existem herdeiros necessários. 
Legitimação concorrente
Para o ministro, a tese de que a filha pode requerer a nulidade da doação apenas sobre sua parte, vinculando a impugnação do percentual destinado a seu irmão a um questionamento deste, também não pode ser acolhida. 
Segundo Raul Araújo, trata-se de legitimação concorrente, ou seja, “o direito de defesa da herança pertence a todos os herdeiros, não exigindo a lei reunião de todos eles para reclamá-lo judicialmente contra terceiro”. Com a decisão, o primeiro acórdão foi modificado. A doação foi considerada válida e eficaz no tocante a 50% do imóvel. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
REsp 656.990
Ação Coletiva Civil Pública Coisa Julgada Alteração Legislativa

AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM FASE DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA - CONDENAÇÃO IMPOSTA SOB A VIGÊNCIA DA LEI Nº 4.771/65 - TERMO DE COMPROMISSO DE RECUPERAÇÃO AMBIENTAL FIRMADO SOB A ÉGIDE DE TAL TEXTO NORMATIVO - EDIÇÃO DO CÓDIGO FLORESTAL ATUAL - LEI Nº 12.651/12 - APLICAÇÃO DE SEUS DITAMES COM O INTUITO DE SE PRESERVAR O PRINCÍPIO DA ISONOMIA - DESCABIMENTO - ARTIGOS 4º, § 1º E 62 - SENSÍVEL REDUÇÃO DO GRAU DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE - COISA JULGADA - PRESERVAÇÃO - PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO DO RETROCESSO - DECISÃO REFORMADA - RECURSO PROVIDO” 

(TJSP – 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente – AI 2012816-29.2013.8.26.0000 – Rel. Des. João Negrini Filho, j. em 07/11/2013)

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Recurso Excepcional Especial Julgamento Questão de Ordem Pública Não Prequestionada Conhecimento Impossibilidade

“Ausente o necessário prequestionamento, é inviável o exame de  tema trazido no apelo raro e que não foi alvo de debate nas instâncias  ordinárias, ainda que se trate de matéria de ordem pública.  Precedentes” (STJ – 2ª Turma – AgRg no ARESP 275.845/RN – Rel. Min. Og Fernandes, j. em 26/11/2013)
Legitimidade Desconsideração da Personalidade Jurídica Aplicação Incidente ao Processo
“Processo civil. Recurso ordinário em mandado de segurança. Desconsideração da personalidade jurídica de sociedade empresária. Sócios alcançados pelos efeitos da falência. Legitimidade recursal. 
- A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica dispensa a propositura de ação autônoma para tal. Verificados os pressupostos de sua incidência, poderá o Juiz, incidentemente no próprio processo de execução (singular ou coletiva), levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens particulares de seus sócios, de forma a impedir a concretização de fraude à lei ou contra terceiros. 
- O sócio alcançado pela desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresária torna-se parte no processo e assim está legitimado a interpor, perante o Juízo de origem, os recursos tidos por cabíveis, visando a defesa de seus direitos. Recurso ordinário em mandado de segurança a que se nega provimento” 

(STJ – 3ª Turma – RMS 16.274/SP – Rel. Min. Nancy Andrighi, 19/08/2003)

sábado, 11 de janeiro de 2014

Tribunal de Justiça do Pará anula decisão de juiz que hostilizou o Defensor Público

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL
PROCESSO N. 2013.3.018452-8 (CNJ 0000720-36.2012.814.0048)
AGRAVANTE: NÉLIO CUNHA MACHADO (Defensor Público Fernando Albuquerque de Oliveira)
AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARÁ (Promotor de Justiça Mauro José Mendes de Almeida)
PROCURADORA DE JUSTIÇA: CÂNDIDA DE JESUS RIBEIRO DO NASCIMENTO
RELATOR: DES. JOÃO JOSÉ DA SILVA MAROJA

EMENTA

AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. REQUISITO SUBJETIVO. CERTIDÃO CARCERÁRIA DE ATRIBUIÇÃO DO DIRETOR DA CASA PENAL. MAU COMPORTAMENTO CARCERÁRIO: INDISPENSABILIDADE DE CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. COMPROVADA VIOLAÇÃO À CONSTITUIÇÃO DE 1988 E À LEI DE EXECUÇÃO PENAL. AGRAVO PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.
I – A Lei n. 10.792, de 2003, modificou a redação do art. 112 da Lei de Execução Penal, abolindo a exigência de exame criminológico como condição para apreciar pedidos de progressão de regime e outros incidentes executivos, relegando a demonstração do requisito subjetivo a certidão carcerária a ser expedida pelo diretor da casa penal.
II – Todavia, a infeliz opção legislativa não eliminou, obviamente, os direitos constitucionais do apenado ao contraditório e à ampla defesa, de modo que a sua classificação no mau comportamento carcerário somente pode ser procedida após, no mínimo, uma justificação, senão procedimento disciplinar. Precedentes do STF e do STJ.
III – Na espécie destes autos, o agravante foi classificado no mau comportamento carcerário sob acusação de faltas gravíssimas, inclusive incitação a rebeliões, contudo não há notícia de qualquer apuração dos supostos fatos, a sugerir desídia da própria casa penal e do juízo da execução, que poderia, este último, ter determinado a realização de exame criminológico, em caráter facultativo, para elucidar melhor a situação posta.
IV – Agravo provido para, diante da ausência de comprovação da falta grave, determinar a progressão do agravante para o regime semiaberto. Decisão unânime.


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Desembargadores da 3ª Câmara Criminal Isolada do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, sob a presidência da Desembargadora Maria de Nazaré Silva Gouveia dos Santos, em conformidade com a ata de julgamento e as notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer do agravo em execução penal e, no mérito, dar-lhe provimento, nos termos do voto do relator.

Belém (PA), 5 de dezembro de 2013.

Des. João José da Silva Maroja
Relator


RELATÓRIO

     Cuida-se de agravo em execução penal interposto por Nélio Cunha Machado, atacando a decisão que indeferiu o seu pleito de progressão de regime.
     Em suas razões recursais (fls. 18/23), o agravante pondera que o indeferimento da progressão violou a Constituição de 1988, além de tratados e convenções dos quais o Brasil é signatário. Destaca já ter cumprido, à época, um ano e nove meses de sua pena, em regime fechado. Quanto ao seu comportamento carcerário, surpreendentemente, o diretor do estabelecimento penitenciário classificou como “mau”, sob o argumento de que o agravante descumpre normas disciplinares, instiga os outros internos a motins e rebeliões, além de desrespeitar funcionários e diretores da instituição.
     Aponta a inexistência de critérios objetivos a justificar a afirmação, bem como de procedimento administrativo para apuração dos fatos, pois o mau comportamento carcerário decorre da prática de falta disciplinar, apurada de acordo com o contraditório e a ampla defesa. Ressalta que o próprio Ministério Público se manifestou pela impossibilidade de negar a progressão sem que a conduta do apenado fosse objetivo do devido procedimento.
     A decisão judicial, assim, lastrou-se em mero alvedrio do diretor da casa penal, dando margem à administrativização das decisões judiciais em execução penal, transformando o judiciário em mero homologador das deliberações do diretor da casa penal.
     Em contrarrazões (fls. 24/28), o promotor de justiça ratificou seu parecer, no sentido de que a classificação no mau comportamento não se socorreu no procedimento apuratório devido. Aduz que, além do requisito objetivo da progressão, “não há relato de falta grave praticada pelo agravante”. Outrossim, o correto seria, caso houvesse dúvida, que o apenado “fosse submetido a exame criminológico a ser efetuado por comissão técnica especializada que atestasse a sua aptidão para ingressar no regime mais brando”, motivo pelo qual conclui manifestando-se em favor do agravo.
     Seguindo o rito do recurso em sentido estrito, o juízo a quo manteve a decisão agravada (fls. 29/33), alegando haver jurisprudência pacífica nos tribunais superiores sobre o tema. Alega que cabe ao diretor do presídio expedir certidão de comportamento carcerário, recomendando ao defensor público que se atualize e estude diariamente, para evitar “a utilização de teses ultrapassadas, teratológicas e em clara afronta ao ordenamento jurídico”, seguindo em outros juízos de valor.
     Diz, mais, que “a jurisprudência do STJ há consideráveis anos se posiciona no sentido de que o mau comportamento carcerário, atestado pelo Diretor do Presídio, basta para obstar a progressão de regime”. Clama pelo cumprimento das leis, para que não se fira o direito “dos cidadãos de ter uma convivência segura e harmônica em sociedade”. Conclui dizendo que, em matéria de execução penal, vigora o princípio in dubio pro societate.
     A procuradoria de justiça, em seu parecer (fls. 39/42), utiliza os arts. 50, I, e 118, § 2º, da Lei de Execução Penal para recomendar o provimento do agravo.
     É o relatório.

VOTO

     O agravante está condenado à pena de oito anos de reclusão, por um delito de roubo majorado pelo concurso de agentes e emprego de arma.
     Em 6.12.2012, requereu progressão para o regime semiaberto, considerando que, por estar preso desde o flagrante delito, em 7.6.2011 (consoante informa a guia de recolhimento provisório, fls. 2/3), já cumprira o requisito objetivo para a medida. Quanto ao subjetivo, não omitiu o fato de estar classificado no mau comportamento carcerário, por decisão do diretor da casa penal, através de certidão carcerária que impugnou, sob o argumento de não ter havido processo administrativo, assegurados o contraditório e a ampla defesa.
     Invocou precedentes do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande Sul para afirmar que “a mera retórica da autoridade do cárcere não é hábil a sustentar negativa de benefício ao apenado”.
     Pediu também que, após a progressão, seja-lhe deferida saída temporária para o natal, além de expedição de atestado de pena a cumprir e promoção de efetivas ações de reinserção social do apenado. E em caso de não haver vaga no regime semiaberto, pediu desde logo o recolhimento domiciliar.
     O atestado de conduta carcerária (fl. 10), subscrito pelo diretor do Centro de Recuperação Regional de Salinópolis, menciona que “o apenado não desenvolve atividades laborativas nesta Casa Penal” e mais o seguinte:

“Conforme pesquisa realizada em seu prontuário e pelas observações feitas por esse setor, verificou-se que há vários registros que comprometem a sua conduta carcerária. Durante sua permanência nesta Casa Penal, não cumpre as normas disciplinares estabelecidas pela mesma, instiga os demais internos a motins, rebeliões e afins, não respeita funcionários e membros da Direção.”

     A promotoria de justiça, ao funcionar no feito como custos legis, opinou pela concessão da progressão, ao reconhecer que a classificação do apenado não fora precedida do procedimento disciplinar devido (fl. 11). No entanto, o juízo a quo indeferiu o pedido, invocando o art. 112 da Lei de Execução Penal e precedente do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o “mau comportamento carcerário, atestado pelo Diretor do Presídio, basta para obstar a progressão de regime” (fl. 12).
     Houve então o presente recurso, que contou com nova manifestação favorável do órgão ministerial, reiterada pela procuradoria de justiça, desta feita sendo mais enfático quanto à ausência de “relato de falta grave praticada pelo agravante” e, consequentemente, de procedimento disciplinar. Mesmo assim, o juízo a quo manteve sua decisão, partindo para inexplicável e gratuita agressividade contra o defensor público, a quem tratou com falta de educação e desrespeito, mandando que fosse estudar e violando, assim, normas elementares de urbanidade. Em sua decisão, acusa o defensor de agir com ira e desrespeito, o que sugere a existência de animosidade surgida por alguma razão desconhecida, porque nestes autos nada sugere qualquer procedimento reprovável por parte da defesa.
     Estabelecida a controvérsia, imperioso prestar algumas informações que, provavelmente, serão muito didáticas para o juiz prolator da decisão agravada.
     Em sua redação original, o art. 112, parágrafo único, da Lei n. 7.210, de 1984 – Lei de Execução Penal, dispunha que a decisão sobre progressão de regime seria “motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário”.
     Entretanto, como sabem os estudiosos da matéria, a elogiada Lei de Execução Penal brasileira jamais foi cumprida em todos os seus termos. Nunca houve interesse em fazer os investimentos necessários para a sua efetiva implementação, eis que a população carcerária é marginalizada, tanto no sentido do envolvimento com o crime, quanto no sentido de não merecer a atenção do poder público, até porque preso não vota – realidade ainda predominante que começou a mudar recentemente.
     Transformado o sistema penitenciário na tragédia que a ninguém é dado desconhecer, não havia a infraestrutura necessária para a realização do indispensável exame criminológico, o que trazia muitos embaraços para a decisão de incidentes executivos que dele dependiam. A solução encontrada pelo poder público foi tipicamente brasileira: em vez de investir para dotar o sistema da capacidade necessária para suprir as exigências legais, mudou-se a lei para abolir a exigência do exame criminológico!
     Foi assim que veio a lume a Lei n. 10.792, de 2003, que, entre outros desatinos, mudou a redação do art. 112 da LEP, passando a prever que a progressão de regime, o livramento condicional, o indulto e a comutação de penas dependeriam do requisito temporal e também do subjetivo, consistente em “bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento”.
     É a esta norma que o juiz prolator da decisão agravada se aferra, em seu colérico ardor, transparecendo desconhecimento de sua origem obscura, que mereceu severíssimas críticas desde o primeiro momento. Não se está aqui a fazer apologia do exame criminológico, que também faz jus a muitos e relevantes questionamentos. E, sim, a destacar que a mudança legislativa atende a uma tendência muito grave de nosso tempo, que é o expansionismo penal, o aumento da repressão, que se revela sob muitas vertentes, uma delas a chamada administrativização do direito penal e da execução penal – fenômeno que o professor catedrático da Universidad Autónoma de Madri Bernardo Feijoo Sanchez trata como “patologia''.
     Sobre o tema, em parecer sobre projeto de lei que pretende “administracionalizar os benefícios da execução penal”, o autodenominado Movimento Antiterror [Legal], que reúne juristas contrários à expansão do direito penal, é enfático:

“Destarte, a pretensão de administrativizar-se a execução penal acaba por viciar todo o sistema no seu eixo fundamental, justamente na sua maior conquista, consubstanciada no princípio da jurisdição, corroendo a essência garantista da execução da pena e causando intolerável retrocesso institucional e humano. Isto porque, principalmente depois da vitória de 1984, foram abandonados os projetos orientados pela “ajurisdicionalidade” da execução penal, justamente porque neles é eliminada a importante conquista do apenado, a execução penal enquanto espaço de jurisdição.
(...) Em terceiro, a administracionalização afasta o juízo do debate sobre os benefícios (que, como se disse, são direitos), sendo previsível o aumento da rede de corrupção das casas prisionais diante da proximidade do administrador-decisor com o administrado-interessado. Após o exame das questões que envolvem a proposta de projeto, pode-se atestar que se trata de um projeto que esconde a motivação real: aumento de poder nas relações intra-muros. O administrador deterá poder absoluto sobre a vida do encarcerado, aumentando a facilidade de corrupção estatal/institucional já patológica nos presídios.

     Esse fenômeno agiliza a punição, mas compromete a salvaguarda de direitos, pois esta dependerá de medidas judiciais. Além disso, a ação do judiciário está submetida ao contraditório e à ampla defesa, além de exigir fundamentação adequada. Estas exigências, em princípio, não incidem de modo tão intenso sobre decisões administrativas, facilitando o exercício do arbítrio, que pode ser sanado através de recursos internos ou remédios judiciais, mas até lá uma ilegalidade terá sido perpetrada.
     Ao se deixar tomar pela ira, o magistrado não observou que sua argumentação passa ao largo da tese sustentada pelo agravante e pelo Ministério Público. Com efeito, ninguém ignora que, por decisão legislativa malsinada, porém vigente, compete ao diretor da casa penal expedir certidão de conduta carcerária, lastreando-se em informações obtidas junto aos agentes responsáveis pelo trabalho, segurança dentre outros, mas decidindo por conta própria, já que não existe obrigatoriedade de consultar profissionais, como antes se previa através da Comissão Técnica de Classificação.
     A questão trazida aos autos, todavia, não é essa. O que se discute é o fato de que o diretor da casa penal teria violado a Constituição de 1988 e a lei, ao classificar o agravante como preso de mau comportamento, imputando-lhe faltas graves – inclusive incitação a rebeliões –, sem no entanto mandar instaurar qualquer procedimento investigatório.
     Com efeito, trata-se de uma afirmação vazia, que depende da credibilidade cega que se empreste àquela autoridade, porquanto não se sabe quando foi que o agravante praticou tais condutas reprováveis, nem tampouco quem teriam sido os funcionários e membros da direção ofendidos, nem quais as demais violações disciplinares praticadas. Aliás, não se sabe, sequer, se tais fatos realmente aconteceram.
     São tão graves as acusações imputadas ao agravante que causa perplexidade não haver registro de procedimento disciplinar contra ele. Se admitirmos como verdadeiras as alegações do diretor da casa penal, então este é que deveria tornar-se alvo de investigação, por inércia, tão gritante é a sua omissão. E também o juiz da comarca deveria responder disciplinarmente, por não identificar o problema mesmo quando deliberando em autos de execução, deixando de determinar as providências cabíveis.
     Enquanto as autoridades se omitem, o defensor público que denuncia a ilegalidade é atacado. No mínimo, uma inversão de valores.
     Sobre a impossibilidade de classificar preso no mau comportamento carcerário sem a devida apuração, assegurados a ampla defesa e o contraditório, é clara a jurisprudência. Atualmente, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça estão mitigando a exigência de processo disciplinar, no sentido de que este pode ser substituído por uma simples justificação, como demonstram os julgados abaixo, todos deste ano:

“PENAL, PROCESSUAL PENAL E CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PARA JULGAR HABEAS CORPUS: CF. ART. 102, I, “D” E “I”. ROL TAXATIVO. MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA: PARADOXO. ORGANICIDADE DO DIREITO. PRÁTICA DE FALTA GRAVE DURANTE O CUMPRIMENTO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE DEFESA TÉCNICA NO ATO DO INTERROGATÓRIO. NULIDADE SANÁVEL COM A OITIVA DO CONDENADO EM AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. ORDEM DE HABEAS CORPUS DENEGADA. 1. 'A Lei de Execuções Penais não impõe a obrigatoriedade de instauração do procedimento administrativo disciplinar, sendo, entretanto, imprescindível a realização de audiência de justificação, para que seja dada a oportunidade ao Paciente do exercício do contraditório e da ampla defesa'. 2. A oitiva do condenado em audiência de justificação realizada na presença do defensor e do Ministério Público supre eventual nulidade decorrente da ausência ou deficiência de defesa técnica no curso de Procedimento Administrativo Disciplinar instaurado para apurar a prática de falta grave durante o cumprimento da pena privativa de liberdade. Precedentes: HC 109.536, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 15.06.12; RHC 109.847, Primeira Turma, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJ de 06.12.11; HC 112.380, Primeira Turma, Relator o Ministro Dias Toffoli, DJ de 22.06.12. 3. In casu, a) o Juízo da Execução deixou de homologar o PAD sob o fundamento de ausência de defesa técnica no ato do interrogatório, destacando que a nomeação de advogado dativo vinculado ao órgão acusador (SUSEP) para atuar no feito violaria os princípios do contraditório e da ampla defesa; b) A Corte Estadual, no julgamento do agravo em execução interposto pelo Ministério Público afirmou que o ato do interrogatório realizado na via administrativa não acarretou qualquer prejuízo à defesa, bem como determinou fosse realizada audiência de justificação, nos termos do artigo 118, § 2º, da LEP. (...) Ordem de habeas corpus denegada.” (STF, 1ª Turma – HC 110278/RS – rel. Min. LUIZ FUX – j. 25/6/2013 – processo eletrônico DJe-159  DIVULG 14-08-2013  PUBLIC 15-08-2013)

“HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. DESCABIMENTO. COMPETÊNCIA DAS CORTES SUPERIORES. MATÉRIA DE DIREITO ESTRITO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO DESTE TRIBUNAL, EM CONSONÂNCIA COM A SUPREMA CORTE. EXECUÇÃO PENAL. APURAÇÃO DE FALTA GRAVE. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DIRETOR DA PENITENCIÁRIA. ATRIBUIÇÃO EM CONFORMIDADE COM A LEI N.º 7.210/84. MATÉRIA APRECIADA PELA CORTE DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE FLAGRANTE QUE, EVENTUALMENTE, PUDESSE ENSEJAR A CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. ORDEM DE HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDA. (...) Nos termos do art. 59 da Lei n.º 7.210/1984: '[p]raticada a falta disciplinar, deverá ser instaurado o procedimento para sua apuração, conforme regulamento, assegurado o direito de defesa.' (...) Ordem de Habeas corpus não conhecida.” (STJ, 5ª Turma – HC 216506/SP – rel. Min. Laurita Vaz – j. 3/9/2013 – DJe 11/09/2013)

“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR PARA APURAÇÃO DE FALTA GRAVE. AUSÊNCIA DE ADVOGADO. DEFESA FEITA POR ASSESSORIA JURÍDICA DO ÓRGÃO. POSSIBILIDADE. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. (...) O art. 118, § 2º, da Lei de Execução Penal, não impõe a obrigatoriedade de instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar para o reconhecimento da referida infração, mas exige a realização de audiência de justificação que possibilite a oitiva prévia do sentenciado, garantindo-se, desse modo, o exercício do contraditório e da ampla defesa. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ, 5ª Turma – AgRg no REsp 1346921/RS – rel. Min. Campos Marques (convocado) – j. 4/6/2013 – DJe 7/6/2013)

     Resta evidente, portanto, que é vedado ao diretor da casa penal promover classificações prejudiciais ao apenado sem lhe oportunizar o direito de defesa, o que por si só encerra esta questão, dando-se razão ao Ministério Público e ao agravante.
     Contudo, ainda se pode dizer mais. Embora o exame criminológico tenha deixado de ser uma exigência legal, como forma de mitigar os efeitos nocivos da péssima inovação legislativa, o judiciário firmou interpretação de que esse instrumento continua válido, sendo facultativa a sua determinação, e recomendável nos casos em que o juiz da execução pretenda tomar uma deliberação com maior conhecimento de causa.

“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. EXAME CRIMINOLÓGICO. POSSIBILIDADE. SÚMULA VINCULANTE 26. DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. REQUISITO SUBJETIVO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO NESTE WRIT. VEDAÇÃO. JURISPRUDÊNCIA DO STF. ORDEM DENEGADA. I – Prevalece nesta Corte o entendimento no sentido de que a alteração do artigo 112 da LEP pela Lei 10.792/2003 não proibiu a realização do exame criminológico, quando necessário para a avaliação do sentenciado, tampouco proibiu a sua utilização para a formação do convencimento do magistrado sobre o direito de promoção para regime mais brando. (...) No caso dos autos, o acórdão proferido do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo está em consonância com a jurisprudência desta Corte, pois ao concluir pela necessidade de realização do exame criminológico apresentou fundamentação idônea. (...) Ordem denegada.” (STF, HC 114409/SP – rel. Min. Ricardo Lewandowski – j. 19/3/2013 – processo eletrônico DJe-160  DIVULG 15-08-2013 PUBLIC 16-08-2013)

     Em um caso tão controverso como este, deveria o juiz da execução penal promover as medidas necessárias para analisar o caso do agravante, em vez de simplesmente se conformar com qualquer manifestação da casa penal, cuja ilegalidade foi ratificada e reiterada pelo próprio juízo.
     Por último, o magistrado prolator da decisão agravada atacou o defensor público como “colérico e singelo condutor de teses vencidas” (fl. 29), para ao final de sua decisão asseverar que “em matéria de execução, vigora o princípio do in dubio pro societate (na dúvida, deve-se interpretar em favor da sociedade” (fl. 32).
     Poucos argumentos são tão obsoletos, abusivos e inconstitucionais quanto o tal in dubio pro societate, em que pese a sua subsistência na jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal Federal. Há, todavia, decisões em sentido contrário, como a que as Câmaras Criminais Reunidas deste tribunal proferiram, à unanimidade, em feito sob minha relatoria:

“EMBARGOS INFRINGENTES EM RECURSO EM SENTIDO ESTRITO CONTRA PRONÚNCIA DO RÉU. IN DUBIO PRO SOCIETATE: VIOLAÇÃO À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CERCEAMENTO DA PLENITUDE DA DEFESA. MÉRITO DA PRETENSÃO PUNITIVA. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. PLAUSIBILIDADE DA IMPUTAÇÃO. RECURSO IMPROVIDO. DECISÃO UNÂNIME. I – O brocardo in dubio pro societate não se coaduna com a vigente ordem constitucional brasileira pois, se persistem dúvidas quanto ao envolvimento do réu no crime, é porque o Ministério Público não foi capaz de comprovar a plausibilidade da imputação, não se podendo resolver essa falência funcional em prejuízo do acusado. (...) Embargos improvidos. Decisão unânime.” (TJ/PA, Câmaras Criminais Reunidas – Embargos Infringentes em Recurso em Sentido Estrito n. 2004.3.001482-2 – rel. Des. João José da Silva Maroja – Acórdão n. 61.503 – j. 24.4.2006 – DJ 5.5.2006)

     Sob toda a fundamentação supra, e acolhendo as sucessivas manifestações do Ministério Público, conheço do agravo e, no mérito, dou-lhe provimento para, reformando a decisão agravada, determinar ao juízo a quo que promova a progressão do agravante para o regime semiaberto, salvo se o mesmo tiver sofrido, no prazo legal, penalidade pela prática de falta grave, devidamente apurada sob a forma de procedimento disciplinar ou justificação, em relação a fatos diversos daqueles que levaram à emissão do atestado de conduta carcerária de fl. 10.
     Devido ao provimento do agravo, impende analisar, ainda, os pedidos consectários.
     Foi pedida saída temporária para o natal de 2012, pretensão obviamente inviabilizada, pela perda de seu objeto. Pedido semelhante, que somente é cabível no regime semiaberto, em relação às festividades deste ano, deve ser apresentado diretamente ao juízo da execução. Este tribunal dele não pode conhecer, sob pena de supressão de instância.
     Acerca do atestado de pena a cumprir, é direito inquestionável do apenado e não foi recusado expressamente pelo juízo a quo. Retornados estes autos ao juízo de origem, deve ser atendido o pleito.
     Sobre a promoção de efetivas ações de reinserção social do apenado, cuida-se de pretensão legítima, respaldada pela constituição e legislação específica, mas que deve ser objeto de conhecimento original pelo juízo da execução penal, tanto para evitar a supressão de instância, quanto porque é ele que conhece a realidade penitenciária da região onde se encontra o agravante, para deliberar sobre o que é possível fazer.
     Por último, sobre a pretensão de recolhimento domiciliar em caso de inexistência de vaga no regime semiaberto, também se trata de matéria a ser conhecida originalmente pelo juízo da execução penal.
     É como voto.
     Belém, 5 de dezembro de 2013.

Des. João José da Silva Maroja
Relator